Marca de maquiagem é criticada ao vender “tinta preta” para tom mais escuro de base

A marca Youthforia, não disponível no Brasil, causou polêmica ao lançar os novos tons para a base Date Night, que já era uma tentativa de lidar com a negativa da falta de diversidade na cartela inicial do produto; lista de ingredientes do item indica apenas pigmento preto na composição

“De qual lado do meu rosto está a tinta preta e a base Youthforia?”. Com cada metade do rosto coberto com um produto preto, a influenciadora de beleza, que tem uma série em seu perfil onde mostra o tom mais escuro de produtos de maquiagem, faz um teste da base tom 600 da Youthforia, a cor mais escura da linha.

O vídeo, publicado nas redes sociais na norte-americana na segunda-feira (30), tem mais de 11 milhões de visualizações, cerca de 1.6 milhão de curtidas e iniciou um debate sobre racismo no mercado da beleza. Ao aplicar a base e uma tinta preta no rosto, Golloria mostra que ambos os produtos são bem parecidos.

A linha Date Night, Youthforia, marca que não está disponível no Brasil, já tinha sido criticada em outubro de 2023 após lançar 15 tons do Date Night Skin Tint. Criadores de conteúdo de beleza fizeram comentários negativos sobre a falta de diversidade na cartela e, com isso, a empresa mostrar que não é inclusiva.

Em respostas às críticas, a marca ampliou sua gama de tonalidades em março, lançando 10 novos tons de base. Mas a tentativa da Youthforia de corrigir os seus erros causou reações ainda mais adversas.

“Quando dizemos que queremos que vocês façam tonalidades para nós, não queremos dizer que [vocês] devem ir ao laboratório e peçam por um preto de show de minstrel”, diz Golloria no vídeo. “O que queremos dizer é para vocês pegarem os marrons que já fizeram e criarem tons de base. Façam o que for necessário no laboratório para que seja um tom de marrom mais escuro.”

Vale lembrar que minstrel era um tipo de espetáculo que acontecia nos Estados Unidos durante o século XIX, fazia uma representação estereotipada e caricata de pessoas negras e os artistas brancos pintavam os rostos com carvão ou tinta escura.

Outras reações, inclusive no Brasil

Vários outros influenciadores e especialistas em beleza nos EUA compartilharam o vídeo de Golloria George para também expressarem suas opiniões e críticas sobre a nova tonalidade de Youthforia. No Brasil, o jornalista de beleza e maquiador profissional Tássio Santos trouxe o caso para debate.

“Hoje existe uma fórmula pronta do que as pessoas entendem como inclusão no mercado de maquiagem. O que é um prato cheio para racistas driblarem o jogo. No meu livro chamo isso de ‘diversidade falsificada'”, disse o autor de Tem minha cor? (Editora Telha; R$ 59)

Pigmento preto puro

Tássio Santos, conhecido também como herdeira da beleza, é consultor de diversidade para marcas de maquiagem no Brasil e chamou atenção para a lista de ingredientes do tom mais escuro da base. “Só tem pigmento preto, sem subtom alguém, é pigmento puro.”

O químico cosmético Javon Ford também observou as diferenças entre os tons mais claros e os mais escuros da marca. A lista de ingredientes para um dos tons mais claros inclui três cores diferentes, indicadas pelo marcador “CI” na parte inferior. Ford explicou em um vídeo o que cada uma representa e disse que essas são “praticamente as únicas cores necessárias para criar um tom mais claro”.

O outro lado

A fundadora da Youthforia, Fiona Co Chan, teve que responder às críticas à falta de inclusão da marca desde o lançamento de seus primeiros 15 tons de base no ano passado. Em um vídeo que foi excluído do perfil oficial, ela disse que a primeira leva da linha foi uma “prova de conceito” para ver se a marca teria sucesso.

Antes de lançar os novos tons em março desde ano, Chan postou um vídeo no TikTok da Youthforia dizendo que teve dificuldade em encontrar um modelo para o tom mais escuro. “Estou super estressado porque preciso encontrar um modelo para o nosso tom mais escuro de base Youthforia”, disse. Ela explica que eles procuraram agências de modelos, mas não conseguiram encontrar nenhum modelo em que a base funcionasse. “Espero que as agências de modelos assinem com modelos mais diversos”, chegou a escrever Fiona Co Chan.

Ao responder comentários de fãs nas redes sociais nesta semana, a marca escreveu: “Está tendo uma confusão. Pessoas estão sugerindo que nosso tom mais escuro de base (Shade 600) é ‘pintura facial preta’ e não se destina a pessoas reais. Criamos a tonalidade 600 como parte de nossa expansão de dez tonalidades em março passado. Ouvimos todos em alto e bom som em outubro passado que nossas bases não eram suficientemente escuras ou inclusivas”, diz o texto. A marca diz ainda que trabalhou com maquiadores e testou o produto em pessoas reais.

+ sobre o tema

Por que a nova coleção da Carolina Herrera causou polêmica no México

A secretária de cultura do país, Alejandra Frausto, acusou...

Racismo e agressão a negros em SP

Cinco jovens foram presos pela Polícia Civil em São...

Não existe bala perdida. Sobre as prováveis violências policiais no Brasil

Este artigo foi escrito como texto-base para participação no debate...

para lembrar

UFRB adota integralmente Lei de Cotas

A Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) vai...

O movimento “Black Lives Matter” organiza-se e procura definir-se politicamente

O movimento Black Lives Matter (“As vidas dos negros...
spot_imgspot_img

Ação afirmativa no Brasil, política virtuosa no século 21

As políticas públicas de ação afirmativa tiveram seu marco inicial no Brasil em 2001, quando o governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho sancionou...

Decisão do STF sobre maconha é avanço relativo

Movimentos é uma organização de jovens favelados e periféricos brasileiros, que atuam, via educação, arte e comunicação, no enfrentamento à violência, ao racismo, às desigualdades....

Por que o racismo é uma crise de saúde

Quando Layal Liverpool era adolescente, na Holanda, ela começou a observar pequenas manchas sem pigmento no rosto e nos braços. O médico receitou antibióticos e...
-+=