Morador de rua que socorreu vítima de estupro ganha emprego

Everton Soares Pereira, 35 anos, pediu trabalho na clínica veterinária que ofereceu acompanhamento para seus cães

por Fernanda da Costa no ZH Noticias

 O altruísmo do morador de rua Everton Soares Pereira, 35 anos, e da proprietária de uma clínica veterinária Silvia Mara, 38, fez suas vidas se cruzarem nesta semana. A coragem do guardador de carros, que mesmo sob ameça de ser morto a tiros ajudou a salvar uma adolescente vítima de estupro, motivou a solidariedade da empresária, que o ajuda não apenas a cuidar dos cães, mas também a melhorar de vida. Os dois são a prova de que a gentileza é cíclica, e alimentada pelo próprio combustível.

Embora se conheçam há apenas quatro dias, a dupla já demonstra a intimidade de velhos amigos.

— Agora tu achou uma amiga meio louca, né? — questiona Silvia, batendo no ombro de Pereira.

— E meio neurótica — responde ele, aos risos.

— É que eu serei uma chefe chata e exigente, tu sabe disso — completa a empresária.

Na sexta-feira, os dois fizeram o que chamam de “acordo de cavalheiros”. Silvia dará um emprego a Pereira na clínica veterinária. Em troca, além do salário e da carteira de trabalho assinada, ele dormirá em um albergue e tentará ficar longe do crack, droga que o arrastou para a rua, há oito anos.

Natural de São Lourenço do Sul, ele tinha família — mulher e dois filhos — e um emprego em uma cabanha, onde cuidava de cavalos crioulos, mas perdeu tudo ao se render ao vício. Diz que sabe muito da lida com os animais, da encilha ao laço, e que já cuidou de cavalo selecionado para o Freio de Ouro. Nas ruas da Capital, chegou a atuar como catador, mas atualmente estava apenas guardando carros no Centro e na Cidade Baixa.

No último domingo, por volta das 23h30min, estava próximo ao Anfiteatro Pôr do Sol quando ouviu gritos de uma adolescente, que estaria sendo estuprada por dois homens. Chegou ao local do crime e pediu para que eles a largassem, mas recebeu em troca uma ameaça de ser morto a tiros.

Enquanto isso, outro morador de rua chamava a polícia, que chegou ao local em seguida. A adolescente foi encaminhada desacordada ao Hospital Fêmina, onde permaneceu internada até a tarde de terça-feira, e os dois suspeitos foram presos em flagrante. Um deles, que é réu primário, foi solto no dia seguinte, por decisão Judicial.

A atitude de Pereira comoveu Silvia. Após ler a reportagem de Zero Hora que contou a história do morador de rua, em que ele pediu apenas vacinas para os seis filhotes de sua cadela Alemoa, ela decidiu montar um mutirão para ajudá-lo. Na terça-feira, foi ao barraco onde ele mora acompanhada de um médico veterinário, dois auxiliares de clínica veterinária e um ativista de direitos dos animais para oferecer vacinas, acompanhamento médico e castração a todos os cães.

— O Everton aceitou tudo que oferecemos, pareceu que estava nos esperando. Adorei conhecer ele — conta Silvia.

Na quinta-feira, foi Everton quem procurou a voluntária. Deixou um recado com a motorista da clínica, dizendo que queria conversar com Silvia. Um dia depois, apareceu no estabelecimento para pedir uma vaga de emprego no local.

— Queremos assinar a carteira dele, então vamos oferecer um treinamento e um período de experiência, que eu espero que dê certo — comenta a empresária.

O primeiro passo para o emprego formal foi dado ainda na sexta-feira, quando o marido de Silvia levou Pereira a uma delegacia, para registrar uma ocorrência de perda dos documentos. O registro é necessário para solicitar as segundas vias.

O casal também contou com a ajuda de um centro espírita, que abrigará Pereira por 30 dias. Depois, planejam arrumar um espaço na própria clínica para o amigo.

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