Quando se fala em violência doméstica e familiar contra a mulher, pelo menos três características são observadas: ela é cotidiana, habitual e vinculada a relações hierárquicas de poder. A complexidade desse tipo de violência é reforçada pelos números no âmbito do Judiciário: de 331.796 processos em varas e juizados especializados, 1.577 resultaram em prisões preventivas e 9.715 em prisões em flagrante. Os dados são do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do período que vai de 2006 — ano de criação da Lei Maria da Penha — a julho de 2010. A aplicação da norma é questionada pela coordenadora nacional do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), Carmen de Campos: “Ainda aplicamos nossa lei na lógica da valorização da família, em detrimento da integridade física. As prisões ainda são mínimas”.
Por: Larissa Leite
De acordo com a presidente do Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid), Luciane Bortoleto, a maioria das prisões preventivas ocorre em função do descumprimento, pelos acusados, de medidas determinadas pela Justiça para a proteção da mulher. As chamadas medidas protetivas, previstas pela Lei Maria da Penha, abrangem exigências como a suspensão da posse de armas, afastamento do lar e proibição de aproximação da ofendida (fixando limite mínimo de distância). Segundo o CNJ, 57% dos processos na Justiça desde 2006 envolveram medidas protetivas. Para Luciane, este é um índice positivo. “Ainda que tenhamos inúmeras dificuldades na Justiça, estamos conseguindo determinar efetivas proteções às mulheres. Esse é um procedimento previsto apenas depois da Maria da Penha.”
O percentual da utilização das medidas foi divulgado ontem, durante a 5ª Jornada Lei Maria da Penha. Na ocasião, a ministra Iriny Lopes, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, acusou a Justiça de morosidade na aplicação da lei. “A medida protetiva deve ser dada em caráter de urgência. Existem casos em que se esperou até 100 dias para que fosse feita. Algumas mulheres morrem antes de o processo ser concluído”, acusou.
De acordo com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a lentidão afeta a Justiça como um todo: “Temos morosidade em todo o sistema judicial. Nesse acaso, se acentua ainda mais, porque muita vezes há o preconceito, uma visão distorcida que agentes públicos têm em relação à violência contra a mulher”. O ministro ainda ressaltou que o país não conta com um sistema de informação atualizado que abrange dados como número de homicídios. “Fizemos o último Mapa da Violência com dados desatualizados do Ministério da Saúde”, afirmou.
Fonte: Correio Braziliense