CCBB do Rio recebe mostra sobre arte africana contemporânea

Exposição que estreia em janeiro é a maior do gênero já realizada no país

Do  NOTÍCIAS AO MINUTO

© Courtesy Kudzanai Chiurai and the Goodman Gallery

Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) do Rio recebe a partir de 20 de janeiro ‘Ex Africa’, a maior mostra sobre arte africana contemporânea já realizada no Brasil. A exposição reunirá trabalhos de 20 artistas, de oito países, numa cuidadosa seleção de mais de 80 obras.

Fotografias, pinturas, esculturas, performances, vídeos e uma gigantesca instalação assinada pelo ganês Ibrahim Mahama (em cada cidade ele vai construir uma instalação particular, com materiais usados e doados por trabalhadores locais) se relacionam na exposição por meio de quatro eixos distintos: Ecos da História, Corpos e Retratos, O Drama Urbano e Explosões musicais.

A interseção desses eixos mostra que o continente africano vive um contínuo e efervescente processo de renovação criativa e artística, sublinha o curador da exposição, Alfons Hug. Ele conta ainda que esse raciocínio, que está por trás do conceito e do nome da exposição, partiu da frase Ex Africa semper aliquid novi, (da África sempre há novidades a reportar), cunhada há mais de 2 mil anos pelo escritor romano Caio Plínio.

“A arte contemporânea africana deu as costas a dois preconceitos longamente estabelecidos: de um lado o estigma do artesanato e da ‘arte de aeroporto’ e de outro as referências etnológicas. Ainda que não possam ser ignorados os efeitos do colonialismo, não deve ser subestimada a importância do intercâmbio artístico verificado na passagem do período colonial ao pós-colonial e, nesse contexto, a reação dos artistas em relação ao período que antecedeu a independência”, afirma o curador.

Tradição e modernidade

Uma crítica ácida ao colonialismo e ao tráfico de escravos estão em Ecos da História, primeira parte da exposição. Nela, destaca-se uma instalação formada por objetos do tempo do comércio de escravos (algemas, ferros de marcar, moedas, mandados de captura). Assinada pela artista nigeriana Ndidi Dike, a obra propõe uma obscura viagem no tempo, época impiedosa, marcada pelo sofrimento humano e pela cobiça.

As obras sugerem ainda uma reflexão amarga sobre a relação entre a pobreza, o desemprego, as recentes migrações e aspectos relacionados aos tempos dos navios negreiros. Não deixam de lembrar as imposições de uma cultura religiosa ocidental e herança colonial, evidenciada na série de fotografias de Leonce Raphael Agbodjélou, artista do Benim. Em parte de sua obra, ele evoca o Code Noir, decreto em que a administração colonial francesa da África Ocidental regulava a escravatura.

Cosmópoles

Paisagens desoladoras, ordem e caos, modernidade e ruínas. Esses e tantos outros contrates das metrópoles africanas estão nas obras de O Drama Urbano. Um dos destaques vai para a videoinstalação Ponte City, nome de um arranha-céu no centro de Joanesburgo. Assinada pelos artistas sul-africanos Mikhael Subotsky e Patrick Waterhouse, a obra é composta por 12 janelas digitais que simulam a vista do edifício marcado por histórias de decadência e gentrificação.

Karo Akpokiere, nascido em Lagos (maior cidade da Nigéria e uma das maiores do mundo) assina ilustrações, com fortes elementos da cultura pop, que fazem uma sátira à miríade de anúncios publicitários que invadem diariamente a megalópole e refletem modismos, o mercado e suas desigualdades, a política e negociatas de toda natureza.

Expressões do corpo

Cabelos trançados que lembram delicadas esculturas; retratos com ares ironicamente pomposos remetem a notáveis africanos que atuaram na Europa entre os séculos XVI e XIX. A força expressiva da estética corporal está nas fotografias, vídeos e instalações de Corpos e Retratos, recorte que traz os famigerados autorretratos do senegalês Omar Victor Diop e a série Hairdo Revolution (revolução do penteado), com fotografias em preto e branco do nigeriano Okhai Ojeikere.

Outro destaque do eixo Corpos e Retratos é a arte multifacetada do angolano Nástio Mosquito. Por meio de vídeos, performances, música experimental, instalações e poesia, o artista levanta questões em torno da fé, identidade, herança colonial, entre outros temas. “Para onde queremos ir? O que queremos construir?”, ele pergunta. “Não seja cool, seja relevante. E se conseguir ser cool de maneira relevante, melhor ainda”, diz. Na mostra ele apresenta uma videoinstalação da música Hilário.

Galerias musicais

Do afrobeat de Fela Kuti, ao pop nigeriano, Explosões Musicais transforma uma das galerias de “Ex Africa” no “Clube Lagos”. Poder, sexo, riqueza e religião são temas habituais da música africana e ganham relevância nesta sala onde os clichês da world music dão lugar à autenticidade do Naija Pop. O New Afrika Shrine, de Femi Kuti, muito popular na cena nigeriana, também está entre os destaques.

*Integrando a programação da exposição Ex Africa, também será realizada no CCBB, no dia 22 de janeiro, uma mesa redonda sobre a produção artística e os caminhos entre Brasil e África. Mediado pelo curador Alfons Hug, o debate terá a participação do artista egípcio Youssef Limoud e do brasileiro Arjan Martins, que participou de uma exposição no Brazilian Quarter de Lagos (Nigéria).

SERVIÇO

Ex Africa

CCBB Rio de Janeiro (Rua Primeiro de Março, 66 – Centro)

De 20 de janeiro a 26 de março | quarta a segunda-feira, 9h às 21h.

Informações: www.bb.com.br/cultura

Entrada gratuita

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