Emicida no Rio de Janeiro: “Ninguém chora por cinco moleque tipo nóiz”

Ele dedicou o final de seu show no Imperator aos jovens assassinados pela PM carioca quando voltavam da comemoração pelo primeiro salário de um deles

Do Blog do Emicida

Primeiro, destruíram as vidas em torno de um rio. E diante do pouco que pode se fazer após a tragédia anunciada, veio a solidariedade e a memória: elas foram relembradas em um show na cidade de Belo Horizonte, na terça.
A seguir, mais cinco vidas foram metralhadas pela PM carioca. E para estes “cinco moleque tipo nóiz”, Emicida dedicou os últimos minutos de seu show no Imperator – Centro Cultural João Nogueira, em que interpretou músicas do sambista Cartola.

Em sua fala, destacou a importância de não “selecionar pelo que você chora”, a exemplo da tragédia em Paris, já que ninguém precisa ser vítima de terrorismo, em lugar nenhum. Mas, ressaltou que o que lhe causou indignação, mesmo, foi o assassinato dos cincos jovens em Costa Barros. Eles voltavam de uma comemoração no Parque de Madureira, já que um dos meninos tinha recebido seu primeiro salário. A PM comemorou também, disparando 111 tiros no carro. Trinta deles, acertaram os alvos.
Por eles, Emicida prosseguiu:

5 moleque tipo nóiz

5 moleque tipo nóiz
Que acabaram assim
Que fim, sem voz
Silêncio dos verme
Medalha pro algoz
Quando eles mata
5 moleque tipo nóiz
Não vai ter hashtag
Nem hoje, nem pós
Ninguém chora
Por 5 moleque tipo nóiz
Pra forjar crime que num existe
O jornal é veloz
Triste sina, de 5 moleque tipo nóiz
Pense se fossem brancos
Se fossem playboys
Mas num era
Era 5 moleque tipo nóiz
Então que a mãe de cada um
Chore a sós
É sempre assim quando
É 5 moleque tipo nóiz
Mais luto pra quem sempre luta
Gargantas e nós
Nunca esqueça
Eram 5 moleques tipo nóiz
Je suis porra nenhuma
Somos todos atroz
Quando o corpo é de
5 moleque tipo nóiz
O que mudou
Desde o tempo de nossos avós
Quando acertam
5 moleque tipo nóiz
Mortos como o rio doce
Sangue prum tapajós
Sai do corpo de
5 moleques tipo nóiz
Nessa guerra desigual
Só tem contras, não prós
Sem novidade pra
5 moleques tipo nóiz

O blog O Furor fez o registro em vídeo, e uma análise que compartilhamos em parte aqui:

Nós não vivemos na pele. Nós não sabemos o que é ser um “muleque tipo nós”. E é nisso que o poema do Emicida toca. Ele faz com que nós, que somos incapazes de imaginar o que é ser alvo de preconceito sistemático e institucionalizado por séculos, comecemos quem sabe a ter uma ideia do que isso é; dá voz a um pouco dessa opressão que foi calada durante estes mesmos séculos, que foi relegada aos rodapés dos livros de história, àquele capítulo curto sobre os quilombos, sobre a resistência negra; e, mais que tudo, talvez dê força para que essa resistência continue.

 

 

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