Estereótipo sobre identidade social influencia sua trajetória?

A imagem que um indivíduo tem de si e a percepção de pertencimento a diferentes grupos sociais exercem consideráveis influências na sua trajetória de vida. Devido ao expressivo impacto nas interações humanas, a identidade social representa um conceito central de análise para diversos fenômenos estudados pela psicologia social, sociologia, antropologia e ciência política.

Na economia, este conceito tem ganhado progressivo espaço nos últimos anos. Em 2000, George Akerlof, prêmio Nobel em 2001, e Rachel Kranton, publicaram no The Quarterly Journal of Economics um modelo teórico introduzindo a identidade na análise econômica quantitativa (“Economics and identity”, 2000).

Akerlof e Kraton argumentaram que a escolha da identidade pode representar a decisão “econômica” mais importante que um indivíduo faz e que a incorporação desse conceito na economia poderia oferecer uma nova perspectiva.

Basicamente, existe uma série de categorizações sociais possíveis, como o gênero, a raça, a profissão, a classe social, os padrões de beleza, a religião, entre outras.

Um ponto fundamental no que diz respeito aos grupos sociais surge do fato de que experimentos em psicologia social apresentam evidências empíricas sugerindo que as pessoas rapidamente categorizam umas às outras.

Assim, antes de você ter a oportunidade de revelar suas características como indivíduo, você tende a ser classificado e julgado a partir do grupo social em que está inserido.

Por sua vez, o processo histórico faz com que determinados grupos se tornem mais proeminentes que outros. Adicionalmente, cada grupo apresenta uma norma social distinta e, consequentemente, isso afeta o comportamento e a trajetória pessoal em diversos aspectos.

Pessoas inseridas em grupos proeminentes gozam de benefícios específicos e podem alcançar determinados objetivos empregando quantidade de esforço inferior do que o daqueles inseridos em grupos de menor status social. Nesse âmbito, em determinados contextos, setores da elite brasileira e a figura do homem branco costumam ser excelentes exemplos.

Pesquisas sugerem que os indivíduos têm mais probabilidade de oferecer vantagens para aqueles dentro da sua categorização social do que para os que pertencem a outras. Além disso, eles também tendem a ter opiniões mais elevadas sobre os membros do seu próprio grupo.

Em 2009, Yan Chen e Sherry Li publicaram na American Economic Review o resultado de um experimento em que estimaram o efeito da identidade nas preferências sociais. Como resultado, encontraram que os participantes tinham 19% mais chance de recompensar por bom comportamento e 13% menos chance de punir por mau comportamento um membro do próprio grupo (“Group Identity and Social Preferences”, 2009).

Adicionalmente, as imagens preconcebidas ligadas aos grupos identitários podem afetar o comportamento e o desempenho das pessoas. Nesse contexto, sabe-se que existe o estereótipo de que os homens têm melhores habilidades quantitativas.

Em experimento realizado com mulheres americanas de ascendência asiática, os resultados mostraram que, em relação ao grupo de controle, as participantes obtiveram pontuações mais elevadas no teste de matemática quando havia um questionário prévio enfatizando a sua identidade asiática e mais baixas quando tinha um questionário associando a sua identidade feminina (“Stereotype Susceptibility: Identity Salience and Shifts in Quantitative Performance”, 1999).

No que diz respeito às relações raciais, a proeminência da identidade branca foi algo marcante na formação socioeconômica brasileira. Nesse contexto, expressões como “preto de alma branca” ou “cabelo ruim” ainda são comumente usadas em determinados ciclos sociais. Isso será discutido com maior profundidade em colunas futuras.

O texto é uma homenagem à música “Identidade“, de Jorge Aragão.

Michael França
Doutor em Teoria Econômica pela Universidade de São Paulo; foi pesquisador visitante na Universidade Columbia e é pesquisador do Insper.

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