Homens héteros falam sobre o prazer de se vestirem como mulher

Casado há 19 anos e pai de um adolescente de 13, o administrador de empresas Rodolfo*, 45, precisa usar terno e gravata todos os dias por causa do trabalho. Aos sábados, enquanto a mulher está no trabalho e o filho com os amigos, ele aproveita a tranquilidade da casa para colocar vestido, meias finas, escarpins e se maquiar com capricho. Terminada a produção, dedica-se a admirar sua versão feminina no amplo espelho do quarto de casal. “Tenho prazer em me ver bonita”, afirma.

Por Heloísa Noronha Do Uol

O engenheiro Márcio*, 36, volta e meia esconde sob suas calças jeans uma calcinha delicada de renda ou de seda. “Sempre fico com receio de que alguém perceba algo, mas a sensação que as peças femininas me provocam acaba falando mais alto”, diz.

Tanto Rodolfo quanto Márcio não são gays: ambos fazem questão de afirmar que nunca tiveram experiências homoafetivas, mas que não teriam nenhum problema em se revelar homossexuais. No entanto, preferem manter o fetiche de se vestirem com peças femininas em segredo, por temerem o preconceito.

Os especialistas afirmam que é complicado –e leviano– dar nomenclaturas a práticas e preferências relacionadas à sexualidade. Até porque nenhuma pessoa é igual à outra, e, entre aquelas que se identificam com as mesmas coisas, cada uma tem suas peculiaridades. É nesse cenário que se destacam os crossdressers como Rodolfo e Márcio.

Travestismo –palavra mais adequada à prática– é uma atividade inteiramente distinta e independente da orientação sexual de uma pessoa. De acordo com o terapeuta sexual Oswaldo Martins Rodrigues Jr., diretor do Inpasex (Instituto Paulista de Sexualidade) e autor do livro “Parafilias – Das Perversões às Variações Sexuais” (Zagodoni Editora), o termo foi cunhado pelo médico alemão Magnus Hirschfekd (1868-1935), em 1910, para designar quem tem prazer em se vestir com roupas do sexo oposto.

Experimentar

Embora à primeira vista pareça o contrário, crossdressers não desejam ser o sexo oposto. “Eles almejam experimentar as sensações que o outro sexo experimenta. Vivenciar o que sentem”, declara o psiquiatra e terapeuta Carlos Eduardo Carrion, de Porto Alegre.

“É difícil tecer uma definição fechada sobre a prática. Há crossdressers que se vestem pelo prazer de estarem montados. Outros podem ter propósitos diferentes, como encontrar parcerias sexuais. Alguns preferem ceder a seus desejos apenas entre quatro paredes, enquanto que para outros sair na rua montados é fundamental”, afirma Anna Paula Vencato, doutora em antropologia social e pesquisadora associada do Núcleo de Pesquisa em Diferenças, Gênero e Sexualidade da Usfcar (Universidade Federal de São Carlos).

O universo de possibilidades é amplo. “Quando em paz com seu desejo, crossdressers sentem excitação e realização sexual. Porém, muitos ainda têm vergonha e culpa”, declara o psicólogo Klecius Borges, autor de “Muito Além do Arco-íris – Amor, Sexo e Relacionamento na Terapia Homoafetiva (Edições GLS).

+ sobre o tema

Policial militar gay do RS será o primeiro a se casar de farda em 178 anos

Miguel Martins, 29, será o primeiro soldado gay da...

Sou evangélica e a favor da legalização do aborto

Não comente antes de ler. Este é o meu...

‘Aumento salarial beneficia especialmente as mulheres’, diz Maria Sylvia, do Geledés

Os dados mostram que as mulheres negras têm as piores taxas...

para lembrar

Basta à violência contra as mulheres

Apesar das medidas judiciais estabelecidas pela Lei Maria da...

Taís Araújo fala sobre feminismo e desabafa: ‘Se a mulher fala não, acabou!’

A cantora e atriz Lellêzinha também participou da conversa. Do...

Ministra: PEC das domésticas não provocará desemprego

Ex-empregada doméstica, a ministra do Tribunal Superior do Trabalho...

Três a cada dez mulheres têm medo de sair de casa

A pandemia de COVID-19 levou o mundo ao isolamento...
spot_imgspot_img

‘Só é sapatão porque não conheceu homem’: Justiça condena imobiliária em MG por ofensas de chefe à corretora de imóveis

A Justiça do Trabalho mineira condenou uma imobiliária da região de Pará de Minas, no Centro-Oeste do estado, a indenizar em R$ 7 mil, por...

Dia do Orgulho LGBTQIA+: conheça a origem da data, celebrada em 28 de junho

Em todo o mundo, o dia 28 de junho é considerado o Dia do Orgulho LGBTQIA+. Durante todo o mês, eventos e paradas celebram as...

VoteLGBT e ANTRA lançam site com mapeamento de pré-candidaturas LGBT para as eleições municipais de 2024

Em uma iniciativa inédita no Brasil, a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e a VoteLGBT, organização da sociedade civil que busca aumentar...
-+=