Mercúrio está andando de novo

Talvez o difícil seja parar e repensar os caminhos. olhar bem se é no mesmo lugar que queríamos estar há cinco anos que ainda queremos chegar

Em maio de 2016 escrevi uma das colunas que mais gosto: “Mercúrio está andando”. Gosto porque adoro escrever sobre astrologia e porque gosto de escrever sobre tantas outras coisas que vocês não sabem. Voltei a escrever porque, desde a última segunda-feira, Mercúrio está andando novamente.

Cinco anos depois, certamente a retrogradação de Mercúrio foi muito mais amplamente divulgada por aí, especialmente na internet. O período injustiçado, conhecido como tempo de desgraças e falhas na comunicação, ruim para assinar contratos, fazer acordos, comprar aparelhos eletrônicos. Não é pra tanto, mas que beleza, neste tempo maluco em que vivemos, ter pelo menos umas três semanas para ficar mais atento à forma como falamos com as pessoas, à forma como ouvimos, como sentimos. E não é raro, acontece umas três vezes por ano todos os anos.

Para contextualizar, é claro que nenhum planeta anda pra trás, mas olhando daqui da Terra, é como se a relação com esse planeta apresentasse um movimento de retrocesso. E que bom é nos lembrarmos que o planeta Terra é só mais um planeta entre tantos, uma micropoeira no Universo. É que Mercúrio é rápido, demora só 88 dias para dar uma volta inteira em torno do Sol. Mercúrio é tipo um Exu-correria, mensageiro, comunicador. Pausa para dizer que, em 2016, minha referência mitológica de Mercúrio era o deus romano. A vida muda…

Outras coisas que mudaram: há cinco anos eu fazia reuniões pelo Skype e era casada. O Golpe na Dilma havia acabado de acontecer, Temer fazia seu primeiro pronunciamento como presidente interino e apresentava seus novos ministros, todos homens e brancos. Hoje isso me parece um retrocesso tão básico em relação à quantidade e ao tipo de retrocessos dos últimos tempos. Mas do mesmo modo que Mercúrio, o atraso depende do ponto de vista que se olha. Eu repito que tem muita gente que tem avançado, e avançado muito, nos últimos tempos.

O WhatsApp ficou fora do ar por 24 horas no Mercúrio Retrógrado de 2016. Este ano, além do app de mensagens, caíram também o Facebook e o Instagram. Bons tempos para se refletir sobre monopólio, sobre quem é dono do nosso conteúdo. Bons tempos para se lembrar que a moeda mais valiosa do mundo é o tempo e, no fim, é disso que Mark Zuckerberg é dono de verdade, do nosso tempo.

O que gosto mesmo do tempo de Mercúrio Retrógrado é das máscaras que caem: naquela época foram as conversas de Romero Jucá e Sérgio Machado. Lembram-se do “grande acordo nacional, com o Supremo, com tudo”? Desta vez foi ministro da Economia dono de offshore em paraíso fiscal, empresário que falsificou atestado de óbito da mãe, e Ciro com sua terceira via que nunca vi mais magra. Escrevi na época e continua valendo: é cada vez mais decisivo ser nítido na comunicação. Isentões não sobreviverão em nenhum lugar do mundo.

Talvez o desastre de Mercúrio Retrógrado esteja no período de revisão, que nos faz ver a quantidade de coisas fora do lugar em nós e no mundo. Talvez o difícil seja parar e repensar os caminhos para andar ou correr como Mercúrio, olhar bem se é no mesmo lugar que queríamos estar há cinco anos que ainda queremos chegar. Talvez o complicado seja sair de cima do muro, destapar as cubas, como dizem os angolanos.

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