Negro, nordestino, filho de diarista, de escola pública acerta 95% no ENEM

Nada tira o mérito deste garoto, seu esforço pessoal e sua determinação o fizeram, aos 16 anos, acertar 95% das questões do ENEM. Mas se antes os João Vitor eram agulhas em palheiro nas universidades, agora eles começam a forçar as grades do preconceito e da discriminação, arrombando as portas e adentrando às melhores universidades, ocupando os lugares em cursos cobiçados e socialmente valorizados.

Por Maria Frô, do  Maria Frô

Um Brasil onde jovens negros, nascidos nos estados nordestinos, filhos de diaristas, vão poder escolher onde querem cursar qualquer curso, em qualquer universidade é um Brasil que muda para melhor.

A escola pública Governador Adauto Bezerra onde João Vitor estuda, mostra que ele não é exceção:  só em 2013, quase metade dos alunos matriculados no 3º ano do colégio (244) garantiram o ingresso no Ensino Superior, 144 deles em universidades públicas.

Ouçam o vídeo reproduzido no blog do Planalto, João Vitor é um menino politizado, com consciência racial, de classe, um verdadeiro cidadão.

Aqui a reportagem que a TV Brasil fez com ele em dezembro:

Aluno de escola pública de Fortaleza acerta 95% do Enem
Blog do Planalto

Uma história de superação e de esforço pessoal de um garoto comprometido a mudar o próprio destino. É dessa forma que pode ser resumida a trajetória do estudante cearense João Vitor Claudiano dos Santos, de 16 anos. Aluno da Escola Estadual Governador Adauto Bezerra, de Fortaleza (CE), João acertou 172 das 180 questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o equivalente a 95% do total da prova. Como comparativo, o menino ultrapassou os 164 acertos da estudante mineira Mariana Drummond, que conquistou o primeiro lugar no Enem em 2013.

Filho da diarista Ana Maria dos Santos, que não sabe ler ou escrever, João e os irmãos sempre valorizaram a oportunidade de estudar:

“Ele dormia, em média, quatro horas por dia, passava os finais de semana estudando e quase não assistia televisão. Eu não tive a oportunidade que eles tiveram, mas tentei passar o valor da educação para os meus filhos”, destacou a mãe do estudante em entrevista ao Brasilidade, o Tumblr do Palácio do Planalto.

De acordo com João Vitor, um dos fatores que mais o motivou a estudar foi a ampliação do acesso às universidades públicas no Brasil nos últimos anos por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e da popularização do Enem.

“Eu e meu irmão, o Gerson, a gente estuda muito. Então, desde 2010, a gente viu, com o sucesso do Enem e do Sisu, que as universidades públicas tinham aberto suas portas. Eu e o Gerson enxergamos nessa oportunidade a chance de conseguirmos vencer na vida e de mudar a realidade da nossa família, que é toda do interior e que não tem ninguém que tenha conseguido chegar à universidade”, afirmou.

Para alcançar esse objetivo, João Vitor se valeu de sua paixão pela leitura para superar uma das maiores dificuldades atribuídas ao Enem: a extensão dos textos e o tamanho da prova.

“O que tem de cansativo no Enem são os textos grandes. Então, minha estratégia foi me adaptar à leitura, ler livros grandes, alguns com linguagem rebuscada”, conta o estudante que começou lendo integralmente os livros didáticos distribuídos gratuitamente pelas escolas públicas. Ele lembra que, a partir do oitavo ano, passou a se interessar também pelos livros clássicos por influências do avô e da mãe:

“Quando eu tinha uns 12 anos, meu avô me deu o livro ‘Caçador de Pipas’ que é um romance extraordinário, daí eu comecei a ver que a leitura não era só fórmula, não era só química, não era só matemática. A minha mãe – que não sabe ler – não deixou que eu esquecesse os clássicos. Quando eu comecei a ler, eu não parei mais. Até hoje eu leio em torno de 80, 90 livros por ano,” contabiliza.

Dificuldades

No entanto, o reconhecimento recente conquistado por seu resultado no Enem não deixa que João Vitor se esqueça das dificuldades que enfrentou durante sua trajetória escolar. Para o estudante, alcançar bons resultados na escola foi a estratégia que adotou para enfrentar o bullying que sempre sofreu em razão do cabelo, da altura e da magreza. Outro episódio que o marcou profundamente foi o fato de não poder ir ao colégio porque seu único tênis havia furado: “Como eu sempre andei bastante para chegar à escola, meu tênis acabou furando. Foi quando eu resolvi não ir ao colégio. As pessoas já me discriminavam antes disso, se eu fosse de chinelo elas iam se distanciar ainda mais, me ‘olhar torto’. Isso me machucava e ainda machuca muito”, afirma. Ao perceber a situação do adolescente, a mãe de João acabou conseguindo comprar um outro calçado para o filho. Essa foi a única vez que o garoto faltou à escola na vida.

Carreira
Apaixonado pela área das ciências exatas e da natureza, João Vitor pretende realizar o sonho de infância de se tornar cientista. Para isso, o estudante planeja cursar a faculdade de Ciências Biológicas em uma importante universidade pública do País e se especializar na área de Biologia Molecular. Ele ainda tem o sonho de participar do Programa Ciência sem Fronteiras do Governo Federal e estudar na Inglaterra ou na Alemanha, segundo ele, os dois países com as pesquisas mais avançadas na área de Biologia Molecular no mundo.

Apoio Escolar

Além do sucesso de João Vitor, a Escola Estadual Adauto Bezerra acumula, nos últimos anos, exemplos de alunos aprovados nas principais universidades do Ceará e do País. Isso se deve à política adotada pela escola de preparar os estudantes com base na qualidade de ensino e em um processo de motivação dos alunos. Só em 2013, quase metade dos alunos matriculados no 3º ano do colégio (244) garantiram o ingresso no Ensino Superior, 144 deles em universidades públicas. Em 2005, esse número não chegava a cinco estudantes. “Há alguns anos, se você chegava em uma turma de 3º ano e perguntava quem acreditava que ia entrar em uma universidade, quatro ou cinco levantavam mão. Hoje, praticamente 100% dos estudantes da Adauto Bezerra acreditam que é possível se tornar universitário, mudar a sua vida e mudar a vida de sua família”, destaca o professor Monteiro Firmino.

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