Brasil, um país historicamente novo, construído em base do colonialismo, escravismo e desigualdade, que deram os moldes de nossa sociedade atual. Em 520 anos de história (1500-2020), 353 deles se sustentaram no regime da escravidão, sobrando apenas 167 anos “livres” do regime escravocrata para negros e índios. Por conta disso, o pensamento social brasileiro moldou-se de acordo com ideais racistas, conservadores e patriarcais, que permeiam nossa estrutura política e econômica de maneira perversa.
De acordo com a The Trans-Atlantic Slave Trade Database, um esforço internacional de catalogação de dados sobre o tráfico de escravos, nove mil viagens foram realizadas por navios negreiros ao Brasil, trazendo 4,9 milhões de africanos. Isso resulta em uma sociedade 56% autodeclarada preta ou parda, mas também em um país em que, segundo o IBGE, os negros representem os 70% entre os 10% mais pobres da população. Em um país em que 68% dos cargos gerenciais são ocupados por brancos, fazendo com que o rendimento salarial do negro brasileiro seja duas vezes menor que o de um branco.
Normalmente em países com longas histórias manchadas pela violência e pelo genocídio, vemos a conservação das narrativas das vítimas e a existência de museus, para que aquela história jamais se repita. Porém aqui no Brasil vemos o contrário. Aqui museus pegam fogo, como em 2018 quando o Museu Nacional foi tomado por um grande incêndio, toda nossa história, ciência e principalmente nosso futuro, viraram cinzas. Ruas, avenidas e escolas com nomes em homenagens a eugenistas, escravistas e torturadores da ditadura militar. O Brasil é um país que esquece, profundamente marcado por essa “cultura do esquecimento” e sobre a história das etnias que literalmente levaram o país nas costas, indígenas e africanos, nos é oferecido migalhas.
Por conta do regime escravocrata as organizações urbanas dependiam das organizações rurais e, mesmo após a abolição, a organização política da sociedade era sustentada por fazendeiros, grandes latifundiários (elite brasileira) e aos seus filhos, sucessores diretos das terras familiares, que tinham o poder de dominar e manipular o cenário político, fazendo com que se perpetuasse o domínio dos grandes latifundiários nas esferas públicas. Essa dominação que excluía e dificultava o acesso da maioria da população à política, fez com que a política se solidificasse no tradicionalismo e conservadorismo.
A cultura do esquecimento se torna um benefício para essa classe, pois se a sociedade não constrói um senso crítico, a estrutura se mantém e todos continuam achando que “está tudo bem”. Podemos percebê-la no nosso dia a dia, quando na escola tudo que aprendemos sobre a África remete somente a escravidão e é construída a imagem de que os escravos brasileiros aceitavam a condição em que viviam, sem resistência alguma. Aprendemos a romantizar a miscigenação, quando na verdade a vinda de imigrantes europeus foi impulsionada com o objetivo de branqueamento da população, a partir de ideias eugenistas. Faz com que não nos indaguemos ruas e avenidas com nome de torturadores da ditadura militar.
O total descaso do estado com os monumentos e museus históricos também refletem essa cultura e a manutenção de pessoas da elite no poder, que não querem que o povo acorde porque simplesmente causaria uma quebra no poder elitista, branco e heteronormativo. O brasileiro criou um país perfeito em seu imaginário, no qual não existe desigualdade e que todo cidadão tem o mesmo acesso às condições básicas. Quando sabemos que a realidade brasileira está bem longe desse ideal.
Bibliografia:
https://www.sabedoriapolitica.com.br/products/pensamento-social-brasileiro/
https://desarquivo.org/sites/default/files/politica_do_impossivel_cinemateca_artigo.pdf