O que a proibição de livros nos diz sobre o futuro que nos aguarda

Enviado por / FonteEcoa, por Tony Marlon

Reportagem da Agência Pública mostrou que existe um movimento coordenado para barrar a entrada de determinados livros no sistema prisional de Minas Gerais. Apenas títulos religiosos ou de autoajuda passam pela triagem, segundo a reportagem.

A LEP (Lei de Execução Penal) garante a toda pessoa privada de liberdade o direito à educação, cultura, atividades intelectuais e o acesso a livros e bibliotecas.

Semanalmente pipocam aqui e ali histórias de diretores e secretários de educação expulsando essa ou aquela literatura da lista de livros aos quais as juventudes têm acesso gratuito garantido pelo Estado, dentro do ambiente escolar. Os títulos são escolhidos a partir de um processo criterioso, com a participação de dezenas de especialistas e levam inúmeros fatores em conta.

O último livro a entrar no radar do autoritarismo foi “O Avesso da Pele”, romance de Jeferson Tenório. Com a proibição, mais curiosidade sobre o tema. Só na Amazon, as vendas cresceram 1400%. Mais pessoas saberão que não só a sociedade, mas as estruturas de poder nacionais se orientam pelo racismo. Ao menos isso.

Outro dia escrevi por aqui que o Estado brasileiro é organizado em castas que se protegem, deixando o restante de nós, reles mortais, do lado de fora quando o bicho pega. E ele pega dia sim, dia também. Irmão desse fenômeno, existe o que vou chamar patrimonialismo moral.

É a ideia de que um bem público está subordinado às crenças pessoais de quem o dirige e não às leis e regulamentações em favor do bem comum. É uma versão burocrática da nossa febre nacional: “Você sabe com quem está falando?”

Os movimentos têm objetivos parecidos, mas operam de maneiras diferentes. O primeiro é discreto, senão não avança. Quando perguntados se existe proibição de tipos de literatura que podem entrar nos presídios, as autoridades mineiras respondem que de modo algum. Seguem o que determina a lei.

O segundo é estrondoso, senão não rende votos. Para anunciar que esse ou aquele livro será proibido pelo bem maior da sociedade, as autoridades políticas correm para as redes sociais. Quanto mais viraliza, melhor. O prejuízo de ambos cai no mesmo lugar: quanto menos eu sei que o mundo não é só o que eu sou e o que eu vivo, mais eu preciso de quem me salva. Aqui na terra, como no Céu.

O Estado é laico e o seu papel é alimentar estratégias para a produção do bem comum, para todas as formas de ser e estar neste plano. Sem distinção ou privilégio.

Não somos mais de 200 milhões de iguais, somos justamente mais de 200 milhões de diferentes. E é essa a maior riqueza que nós temos. Resta saber por quanto tempo mais.

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