O que um empreendedor negro não precisa no Brasil. (+18)

Voltando a escrever e começando por um lado que pouca gente gosta, mas há algo importante para se refletir: “as ferramentas que estão sendo oferecidas realmente são para ajudar(unir) ou apenas para auto promoção (elitizar)?”

Por Hamilton Henrique Do Me Dium

Durante um tempo venho observando e vivendo a caminhada de um empreendedor negro. Não é nada fácil devido a falta de representatividade, oportunidade e etc. Acho que no ano de 2016 fui em mais de 100 eventos de empreendedorismo e empreendedorismo social. As frases que mais ouvi foram “Vai lá e faz!” e “Pare de mimimi”. Para validar essas frases uma série de teóricos apresentaram diversas ferramentas como incubadoras, aceleradoras e todas as “doras” com o mesmo conjunto de ideias. Ouvi conselhos de mentores que nunca validaram nada na rua, termos que mudam todos os dias criando um novo dialeto (“empreendedoriquês”) para um determinado grupo. E assim afastando quem está chegando e transformando algo que deveria ser simples em uma parada “zuada”, esnobe e separatista.

Um dia batendo papo com um amigo sobre o que ele estava entendendo em um evento de empreendedorismo social, ouvi que daquele evento só se tiravam os canapés. Afinal, o que se tira de um evento que não fala a língua do público que “realmente deseja impactar“? Só se tira a comida de graça mesmo(!). Pensei comigo: como ele não estava entendendo nada se já é empreendedor a mais de 10 anos? Essa pergunta me trouxe o entendimento que o empreendedorismo está se tornando algo “cool” e que o nosso discurso de unir está se tornando cada vez mais o mesmo que separar. Quem está no corre diário não participa dessa transformação. Mas será que a intenção realmente é colocar todos no mesmo balaio?

Hoje é comum ver uma pessoa branca, de classe média alta, abandonar a faculdade para vender brigadeiros e usar todos os seus conhecimentos dedesign, storytelling e influência de jornalistas para sair em jornais e revistas e se tornar mestre de uma nova economia. Enquanto a tia do cafezinho, que todo dia acorda as 5 da manhã para vender seu café no terminal de Niterói, não é considerada empreendedora dessa nova economia.

Percebi que nunca fui em um evento para discutir esses assuntos de empreendedorismo, economia criativa e colaborativa em que pelo menos 30% do publico fosse negro. Tendo em vista que somos mais de 50% da população nacional, a ausência dos temas “negro” e “preto” ou o convite direcionado para tais soa meio estranho, não(!)?

Percebi que nos últimos eventos que fui convidado começou a se discutir como integrar, interagir e melhorar os negócios periféricos e negros do país. Fiquei animado(!), mas quando fui olhar a mesa não me vi representado nem como negro nem como periferia. Todos ali falavam de superação, corpo mole e sobre o empreendedor negro/periférico não precisar de dinheiro, mas de força de vontade. “Porque se tiver força de vontade e um pouco de design thinking e conseguir construir um bom crowdfunding, é possivel criar um bom storytelling e tudo fazer sentido. Foi o que fiz em Londres, quando trabalhei de garçom e blá, blá, blá”.

Então percebi que a realidade que estão reproduzindo não é uma criada nas reais necessidades e sim em experiências de outros contextos. Por isso está dando errado. Podemos começar tornando os termos mais inclusivos. Como, por exemplo, crowdfunding = vaquinha coletiva, que é o mesmo que muitas pessoas que se juntam para te ajudar a melhorar ou criar alguma coisa. Storytelling = contar histórias, saber contar boas histórias, assim como a vizinha fofoqueira que conta uma história como ninguém. E por aí vai.

A base precisa de mentorias práticas, no contexto em que ela vive, e não com se faz em Madri. Exemplos de como o Facebook e o Spotify fizeram não surtem efeitos, mas como um boteco virou um bar talvez chame mais a atenção e faça mais sentido. Não venha com o papo de que canvas é fundamental; explique a ferramenta assim como qualquer outra coisa. Nunca use a palavra superação; na moral mesmo(?!), deixa isso quieto, ser negro é complicado.

Por último tente falar do ressignificado do dinheiro de uma outra maneira que não seja “o empreendedor não precisa de dinheiro”. Grandes eventos, negócios, produtos… tudo isso precisa de dinheiro. Quando você diz que o empreendedor negro precisa “parar de mimimi” e depois cria bancas destrutivas para competições de pitch, enterrando as expectativas dos empreendedores, porque não usaram as ferramentas coloridas (post it) da maneira que você ensinou, sem entender o contexto social que ele vive, você está contribuindo para esse vale de separação em que a economia criativa, colaborativa e empreendedorismo são só para alguns. E continuará sendo super normal encontrar nesses eventos brancos, loiros dos olhos azuis, criadores de apps que não servem pra nada.

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