A placa e o menino invisível no mundo de fantasia dos lançamentos imobiliários

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O mercado de lançamentos imobiliários vive de vender sonhos de sofisticação onde eles não existem. Perto da minha casa, há o edifício Lester Young. Eu sempre olho para ele imaginando o que o gênio do saxofone, chamado de “Prez” por sua parceira Billie Holiday, acharia.

Não acharia nada, claro. Posso estar enganado, mas creio ser pouco provável que a maioria das pessoas que vivem ali saibam quem foi Lester Young. Não que isso seja um problema. Não deixa de ser um assombro a criatividade do sujeito que batizou assim um imóvel nas Perdizes. (A quantidade de “villas” com nomes italianos estapafúrdios também é impressionante).

Agora, pouca coisa bate, em matéria de marketing e inovação, a iniciativa da empresa Plano & Plano para vender o “Brand Pensivânia”, no Brooklin. Quem a registrou foi o jornalista César Hernandes em seu Facebook. O nome, que não quer dizer nada em inglês ou português, é o de menos.

Foi criado um boneco de papelão alto, branco, forte e bonito. Atrás dele, segurando-o nas esquinas, ficam as pessoas. No caso, um garoto negro. Hernandes fotografou os dois, chocado. A imagem foi compartilhada milhares de vezes.

A intenção era que o menino ficasse invisível. Ele poderia queimar o filme. Ninguém é racista — alto lá! Mas o foco era o ariano de cartolina. E não é que o “Brand” seja, assim, uma maravilha. O apartamento de um dormitório com suíte tem 36 metros quadrados. O duplex tem 62.

É comum mulheres e crianças ganharem, em média, 40 reais por dia para circular em bairros vendendo empreendimentos. Se eles se sentam durante o trabalho, têm um desconto no pagamento. Vale tudo para driblar a lei Cidade Limpa.

Fico pensando como reagiria o povo que mora no Lester Young ao saber que o gigante Prez (de “President”) era negro e morreu em consequência do abuso de drogas e de álcool aos 49 anos. Como diriam os moradores do condomínio Oscar Wilde, só os tolos não julgam pelas aparências.

Fonte: Diário do Centro do Mundo

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