Por mais que me esforce não consigo ver continuidade na economia e políticas sociais entre governos FHC e Lula.

Por: José Roberto de Toledo – O Estado de S.Paulo

Em 2012, o PT tornou-se o maior partido do Brasil em votos recebidos, eleitorado a governar e dinheiro arrecadado. O partido completa 10 anos de governo federal – o maior tempo contínuo de um mesmo grupo político no poder em períodos de democracia plena. Conquistou a maior cidade do país. A presidente está no auge da popularidade e tem quase 80% de apoio no Congresso, em média. Os dois favoritos para 2014 são do PT.

Reserva moral do PSDB – nas palavras de José Serra -, Fernando Henrique Cardoso descreve sua melancolia com a política partidária e defende a necessidade de “bradar e mostrar indignação e revolta, ainda que pouco se consiga de prático”. Quando a oposição está melancólica, a situação deveria estar exultante. Só que não.

O PT não sai das manchetes, mas por causa do outro lado da força. Condenada pelos ministros que pôs no Supremo Tribunal Federal, a cúpula que levou o partido ao sucesso vê-se na incômoda perspectiva de exercer o poder desde a cadeia. É um preço caro a pagar. Provavelmente caro demais.

As contradições entre o primeiro e o terceiro parágrafos alimentam a especulação: estará o PT no cume à beira do precipício? Ou desfruta a segurança de um espaçoso planalto?

No que depender das previsões das consultorias econômicas e dos “pundits” brasilienses, a derrocada é logo ali na frente. O problema é que se tem mais chance de êxito apostando num cara ou coroa do que acreditando nas projeções de especialistas. Melhor olhar para trás e tentar entender como chegamos aqui.

A estabilização econômica propiciou a emergência de um mercado interno grande e ativo. Aumentos reais do salário mínimo diminuíram a desigualdade de renda e deram lastro para a popularização do crédito. A redução das taxas de juros rompeu o dique financeiro e deixou o dinheiro irrigar a economia. Nada disso é monopólio petista, mas foi o PT que, por oportunidade ou competência, melhor faturou eleitoralmente o processo.

Partidarizar ideias que são patrimônio nacional as enfraquece. Mercado de consumo de massa, menos desequilíbrio entre capital e trabalho, e diminuição da desigualdade de renda são conceitos sempre vulneráveis à reação de quem só se beneficia do mercado de luxo exclusivista, do “rentismo” e do “apartheid” social.

Há cada vez mais desinibidas declarações de que o aumento do salário mínimo é o problema e não a solução, de que há crédito demais para os pobres, de que bom mesmo era quando se podia ir a Paris ou Nova York sem correr o risco de ouvir português na rua.

É coincidência que essa desinibição suceda as condenações pelo STF dos malfeitos petistas? Ou que esteja entremeada a notícias de Pajeros, propinas e patifarias de parasitas do poder que tiveram sua janela de oportunidade durante o mandato do PT?

O risco embutido nos desmandos é que após a condenação das pessoas venha a condenação das ideias que mantiveram seus correligionários no poder. Mesmo que essas ideias não lhes pertençam, nem que elas, por si, tenham qualquer coisa a ver com a corrupção de quem as defendeu eleitoralmente.

Para o grosso da população, mais importante do que quem comanda do barco é que o caminho percorrido desde 1994 não seja interrompido ou, pior, feito em marcha à ré.

Dinheiro e poder. O PT lucrou com o poder. O partido movimentou R$ 1 bilhão na campanha de 2012. Foi a legenda que mais cresceu em arrecadação desde 2008: R$ 362 milhões a mais. Sua fatia cresceu no bolo financeiro dos partidos e a isso corresponderam mais prefeituras e vereadores. PSDB e PMDB arrecadaram proporcionalmente menos e viram sua influência municipal murchar. Dinheiro é voto.

Nem tanto ao precipício, nem tanto ao planalto. O PT tornou-se o maior partido em votos e eleitorado a governar, mas eles são apenas 20% do Brasil. Sua arrecadação é recorde, mas não passou de 17% do total. A presidente tem 80% de apoio no Congresso, mas perde votações com frequência, porque sua base parlamentar é movediça e infiel. Não há poder absoluto nem eterno.

Popularidade e favoritismo a dois anos da eleição valem tanto quanto ser o campeão do primeiro turno em campeonato por pontos corridos: nada – o Atlético Mineiro que o diga.

 

 

Fonte: Mariafro

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