Prefeitura de SP omite de Moraes caso de mulher que teve aborto negado por falta de profissionais

Gestão municipal diz à coluna que 'está apurando o caso citado'

FONTEFolha de São Paulo, por Manoella Smith
Manifestação contra o PL Antiaborto por Estupro realizada na avenida Paulista em 15 de junho - Nelson Almeida - 15.jun.2024/AFP

Ao menos uma mulher teve o procedimento de aborto legal negado no Hospital Municipal Cármino Caricchio, localizado no Tatuapé, na zona lesta da capital paulista, por falta de equipe. O caso ocorreu em maio, segundo a Defensoria Pública de São Paulo.

O relato se contrapõe à informação apresentada pela prefeitura da capital paulista ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes na segunda-feira (24). Segundo a gestão de Ricardo Nunes (MDB), nenhum aborto legal foi realizado na unidade neste ano porque “não houve procura”.

Ao buscar a unidade de saúde, a paciente foi orientada a buscar o Hospital da Mulher, gerido pelo governo estadual. A justificativa dada foi a de que o procedimento não estava sendo ofertado por falta de funcionários.

Além do relato da mulher, que procurou o Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres (Nudem) da Defensoria, o órgão diz ter ouvido do próprio hospital, meses antes, a mesma afirmação sobre a falta de funcionários.

Em março, o Centro de Atendimento Multidisciplinar (CAM) do Nudem entrou em contato, por telefone, com os hospitais municipais credenciados para fazer aborto legal na cidade. O objetivo era coletar informações sobre o acesso ao aborto legal por gestantes com mais de 22 semanas. O Cármino Caricchio respondeu que não estava realizando o procedimento por falta de equipe.

As informações obtidas pela Defensoria divergem da versão apresentada pela gestão Ricardo Nunes (MDB) no âmbito de uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) que questiona a resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) que restringia a interrupção legal da gestação no Brasil.

norma contra a assistolia fetal foi suspensa em maio por decisão cautelar de Alexandre de Moraes. Na semana passada, o magistrado determinou que os hospitais municipais comprovassem que estão oferecendo o serviço nas hipóteses previstas pela lei e cumprindo a decisão proferida por ele.

Após ser intimada, a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo informou que “não houve procura” pelo procedimento no Hospital Municipal Cármino Caricchio. A gestão municipal disse ainda que, desde janeiro deste ano, quatro pacientes puderam interromper gestações acima de 22 semanas nos hospitais da rede municipal.

Nesta quarta-feira (26), o magistrado voltou a intimar as instituições hospitalares e determinou que sejam prestadas informações sobre “eventual negativa de atendimento a pacientes nas hipóteses de aborto legal, acompanhada de comprovação documental”.

Os relatos foram feitos pela Defensoria à Justiça e constam em um pedido para ingressar em uma ação popular que pede a retomada do serviço de aborto legal no Hospital Vila Nova Cachoeirinha.

O órgão quer participar do processo na condição de custos vulnerabilis (guardiã dos vulneráveis) —nome que se dá à intervenção em um processo para garantir a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais.

O Cachoeirinha, que era considerado referência na capital paulista, está com o serviço de aborto legal suspenso desde dezembro do ano passado. A justificativa da prefeitura é a de que a unidade “está atendendo outros procedimentos ginecológicos”.

Em 20 de maio deste ano, a 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo rejeitou um recurso da deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) que pedia a retomada do serviço no hospital, mas determinou que o município deveria prestar o serviço sem impor limite gestacional.

Desde que a decisão foi proferida, a ONG Projeto Vivas diz ter atendido duas pacientes com gestações avançadas que não conseguiram acessar o procedimento na rede municipal. Os casos se somam aos de outras três mulheres que recorreram à organização neste ano após terem o atendimento negado na rede de saúde pública paulistana.

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