Soul retrata de maneira sensível as experiências da vida – e ensina que há beleza nas pequenas coisas

Você já tentou se descrever sem falar sobre trabalho? Ao preencher o perfil em um site de relacionamentos ou apresentar-se à uma pessoa que acabou de conhecer, você fala primeiro sobre quem é ou sobre o que faz? Em uma sociedade obcecada com o sucesso profissional, as duas coisas misturam-se com assustadora naturalidade, e sem nos darmos conta, somos nosso ofício antes de sermos qualquer outra coisa.

Soul, mais novo fruto da parceria Disney e Pixar, chega para desconstruir ideias enraizadas de maneira tão natural, que ao terminarmos de assistir o filme, somos confrontados pela nossa própria existência. Para onde vamos? De onde viemos? O que é viver? E mais importante, o que faz de nós humanos? Tais questionamentos são levantados por um filme de animação infantil, e é aí que encontra-se a genialidade do projeto.

Não é necessário um diploma em filosofia para entender o sentido da vida: ser feliz, tomar sorvete em um dia quente, jogar videogame com um amigo, encontrar amor verdadeiro, bastar-se. A resposta muda conforme crescemos, e nenhuma delas é incorreta porque a vida é feita de pluralidade.

Em Soul, acompanhamos a trajetória de Joe, um professor de música que sonha em ser um músico renomado de jazz. A paixão pela música o motiva, é o gás que o faz acordar todos os dias e aguentar chateações diárias como pegar o metrô lotado, lidar com estudantes melequentos, discutir incansavelmente sobre o futuro com a mãe. Tudo é desgastante, mas o sonho de trabalhar com jazz o move.

Ao sofrer um acidente que separa a alma dele do corpo, Joe encontra-se preso no Pré-Vida e precisa ajudar uma jovem alma a encontrar motivação para descer à Terra. Falar sobre trabalho ou qualquer coisa parecida não funciona, e é só quando 22, a tal jovem alma, acaba na Terra por acidente, é que começamos a repensar sobre tais conceitos, juntamente com Joe.

(Foto: Divulgação/Disney)

Lançado no Disney+ no dia 25 de dezembro, o filme é dublado em português por Jorge Lucas (Joe), Carol Valença (22), Luciana Mello (Dorothea Williams), entre outros. Em entrevista à Rolling Stone Brasil, Jorge e Luciana refletiram sobre a importância do longa. Retratando aspectos que permeiam a perseverança, a busca pelos sonhos e o aprendizado, o filme é, nas palavras dos dubladores, incrivelmente sensível.

“No filme as almas são todas iguais, e isso é uma coisa que o adulto tem que perceber, as crianças entendem isso com muita facilidade. Nós precisamos ter essa sensibilidade, principalmente agora”, afirma Luciana Mello, responsável por dar vida à Dorothea Williams, musicista de jazz renomada que dá à Joe a chance da vida dele.

Mello faz estreia como dubladora, e afirma que inspirou-se em Nina Simone para dublar Dorothea: “Ela é uma personagem maravilhosa, tem alma de diva. É mais séria, mas ao mesmo tempo muito sensível, assim como Nina Simone. Foi isso que tentei passar para a personagem.”

Para Jorge Lucas, que interpreta Joe, o lançamento do filme no final do ano de 2020 foi muito simbólico: “O filme mostra que estamos todos juntos no começo [Pré-Vida], só nos separamos quando descemos à Terra. Mas o objetivo final é nos juntarmos novamente. Em uma época em que nem todas as famílias podem estar juntas fisicamente, devemos lutar para unirmos nossas almas.”

Lucas ainda comentou sobre o aprendizado que Joe e 22 compartilham, como crescem juntos durante o longa: “As almas de Joe e 22 se tocam, e o filme mostra isso com muita sensibilidade. Mostra que devemos nos desdobrar para encontrarmos o nosso caminho interno.”

Soul ousa ao propor debates considerados sérios demais para animações com enfoque no público infantil, assim como Divertida Mente (2015), que abordou temas como a depressão. Além disso, o filme também é responsável por dar vida ao primeiro protagonista afro-americano em uma parceria da Disney e Pixar, o que foi fruto de muita pesquisa para evitar que o longa se apoiasse em clichês.

Para Jorge Lucas, o fato de Joe ser um artista também é um aspecto único: “Joe representa a determinação do artista. A mãe dele insiste que ele encontre um emprego ‘sério’ e isso é muito comum, principalmente quando se é preto: você precisa trabalhar e ganhar dinheiro, ter segurança. Meus pais sempre me apoiaram muito, mas ainda assim, me identifiquei com Joe e o quão determinado ele é”.

Talvez a pergunta mais desafiadora para os dubladores tenha sido definir os personagens em poucas palavras. Para Luciana Mello,Dorothea é a exemplificação da força e do talento. Já Jorge Lucas vê Joe como um determinado. É através das histórias de personagens tão bem construídos que a Disney e a Pixar nos convidam para reflexões tão poderosas sobre o viver. Assista de coração aberto.

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